quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Encontro com o Sol

Sempre que algo novo está para surgir, gosto de consultar oráculos. Na passagem do difícil ano de 2005 para 2006 tirei uma carta no meu tarô de Marselha. Veio O Sol! Este arcano é, literalmente, um dos mais iluminados - se não o mais iluminado – do tarô. Fiquei muito contente, pois realmente estava precisando de luz, muita luz. Por outro lado, senti-me assustada quando Luana, minha filha, na época com quase 11 anos, tirou A Morte, a carta que traz intensa transformação. Só alguns meses depois iria compreender os significados anunciados.

No dia 3 de junho, uma sexta-feira, fui participar da instalação de uma rádio livre no II Encontro Nacional de Agroecologia, na Universidade Federal de Pernambuco. Foi reservado um estande em um local estratégico do encontro para instalação da rádio Livre-Se. Além de ir ao ar pela FM, também havia caixas de som espalhadas em vários lugares do evento. De instante em instante vinha alguém à rádio para cantar uma música, recitar poesia, dar recado, notícia. Foi lindo!

Depois de passarmos o dia no ar, já à noitinha, nós da Livre-Se começamos a desmontar os equipamentos, e, enquanto os meninos corriam atrás de uma escada para tirar a antena, comprei um milho e me sentei numa graminha em frente à rádio. Lá estava Natália, uma velha conhecida, papeando com dois artesãos. E aqui preciso fazer uma pausa para um comentário. Durante alguns anos na minha vida, não muitos, acentuei meu lado‘hipponga’. Essa fase foi intensificada quando fui ao Maranhão e a Bahia e conheci alguns malucos (é assim que são conhecidos os hippies contemporâneos). Aprendi a fazer artesanato, comecei a andar ainda mais largada do que já andava, hospedei vários malucos em minha casa, enfim, só não caí na BR (estrada) porque tinha Luana. O problema é que depois da convivência com um deles comecei a ter um certo abuso e, ao mesmo tempo que sentia uma certa atração ao encontrar com estes artesãos, também sentia repulsa.

Encontrava-me com esse sentimento antagônico no momento em que sentei pra comer meu milho junto a Natália e aos dois artesãos. Um deles, no entanto, logo me atraiu. Chamava-se Geovanir, cabeludo, olhinhos esverdeados e com um jeitinho manso, tranqüilo. Eles haviam vindo de carro da cidade de Cascavel, no Paraná, e acabaram chegando ao Recife. Ficamos conversando, conversando...até que precisei ir embora, porque estava sem carro e minha carona já se ia. Fui pra casa com um sentimento esquisito e bom dentro de mim.

À noite sonhei com ele. Não lembro exatamente como era o sonho, mas era bom, muito bom. Senti que foi algo iluminado, encantado. Acordei com esse sentimento e querendo encontrá-lo.

À tardinha, cheguei na rádio. Em algum momento, ele, muito falante, se chegou, entrevistou um recém conhecido que criava abelha no norte, sobre os benefícios do mel e ficou por ali. Quando fomos nos despedir, já de noite, ele tirou um brinco do pano e me deu. Disse que o amigo dele queria ir embora e que talvez a gente não mais se visse. Nos abraçamos. Fiquei observando ele ir embora e sentia, por algum motivo, que ele não iria, que ele não poderia ir.

Na terça-feira, último dia do encontro, foi realizada uma mobilização no pátio do Carmo, no centro do Recife. Saí do trabalho e passei por lá no final da tarde. Quando menos espero, o avisto. Nos abraçamos e senti algo que eu nunca havia sentido: a energia dos nossos corações. Não sei explicar como foi essa sensação, apenas que foi intensa e sagrada. Ele disse que não rolou de ir embora naquele dia, mas que iria, junto ao amigo, pegar uma carona em um dos ônibus do encontro que estava indo para o Sertão, onde eles haviam deixado o carro. Trocamos e-mail, telefones e nos despedimos.


Sinceramente não me surpreendo no dia seguinte quando o telefone toca e ele do outro lado fala que ainda está no Recife. A carona não deu certo e ele queria saber se podíamos nos encontrar. Quase morro de felicidade! Marcamos de nos ver à tardinha, já que no outro dia ele iria embora, ou melhor, pensava que iria!


Nos encontramos na praça do Diário e sentamos numa mesinha. Observando nossa conversa, e provavelmente a abençoando, estava a estátua de um escritor, que se não me engano era Carlos Pena Filho. Bem ali, com o poeta como testemunha, ouvi tudo que esperei a vida inteira um homem me dizer.


Saímos andando pelo centro do Recife e fomos a uma quitanda/bar na rua do Riachuelo encontrar uns amigos meus. Nos divertimos até pouco antes da meia-noite, quando fui deixá-lo na Cidade Universitária, onde estava hospedado. Quando chegamos, resolvi descer do carro para poder falar com ele direito. E num ato de extrema ousadia taquei um beijo na boca dele. Ficamos nos beijando, beijando, beijando. Ele colocou um colar no meu pescoço e nos despedimos. Dessa vez seria pra valer, ele iria embora no outro dia. Iria.

Mas não foi. Me telefonou, perguntou se podia ir lá pra casa e, desde esse dia, estamos casados. Foi aí que comecei a compreender o simbolismo da carta do Sol que eu havia tirado seis meses antes!

Também entendi o porquê do arcano A Morte ter saído para minha filha. Pra Lua, que sempre morou comigo sozinha, dormia na minha cama e me tinha só pra ela, não foi nada fácil me dividir com alguém.

Três meses depois do nosso primeiro encontro engravidei. Que felicidade! No dia 6 de junho de 2007 nasce Ravi, nosso filho amado. A propósito, Ravi em sânscrito significa Sol. E juro que não lembrei da carta no momento em que escolhemos esse nome.

3 comentários:

Anônimo disse...

Lu, que coisa mais liiiinda essa história. E você descreve de forma muito gostosa. Parabéns.

Eva Duarte disse...

Lu,
sinto-me tão perto de ti q nem imaginas....
se eu fosse escrever sobre o brilho dourado q vejo sobre o mundo agora, entenderias.
um dia te conto.
encontros,
mágicos encontros.
com seres que sabemos antigos em nossas tantas vidas...
muitos beijinhos de Sol!
eva

Anônimo disse...

Lu, que história ensolarada, achei lindo o jeito que vc escreveu, senti as emoções...beijocas